O Presente Ideal

Que o presente ideal nosso de cada dia possa nos encontrar.

 Prefácio:

É possível encontrar o presente ideal? Será que ele existe? Quem alguma vez já se viu na missão de querer ou precisar dar um presente a alguém e não ter a menor ideia sobre o que dar? Quem teve receio de errar na hora da escolha e medo de decepcionar? Quem teve o desejo de querer agradar e de deixar feliz quem recebesse o presente? Quem já procurou um presente para alguém com o objetivo de ajudar? Quem já saiu para comprar um presente para alguém e gostou tanto que acabou comprando para si próprio? Quem em alguma situação precisou dar um presente para alguém que mal conhecia? Quem conhece alguém que parece ter um “dom especial” para escolher presentes, os quais, quem recebe sempre adora? Quem sofre com a ideia de ter que presentear?

Dizem por aí, as vozes populares, que se já pode ser difícil dar presentes aos que conhecemos bem, imagine aquela situação na qual nos sentimos completamente sem ideias para presentear. Ou se temos como um Pré-Juízo de que para dar presentes é preciso gastar dinheiro e, do qual não dispomos no momento. O que fazer?

Vivemos em uma sociedade, em um certo padrão de época, em uma cultura que muitas vezes pode nos dar certos parâmetros de condutas e obrigações. Contudo, no caso de optar por dar ou não presentes, até podemos nos considerar livres. Há quem goste, há quem critique; cabe a nós respeitar essas manifestações de cada pessoa.

Esse texto trará algumas reflexões sobre a arte de presentear, para aqueles que se interessarem pelo assunto, para quem o ato de dar presente tem a ver consigo. Aos quais dar presentes não é algo que tenha a ver, simplesmente, procure algo que tenha a ver consigo. Uma dica é procurar o que tem a ver conosco. Se dar presentes tem a ver consigo, sirva-se de um chá ou café (ou o que preferir) e desejo uma boa leitura!

Introdução:

Falar sobre a arte de dar presentes, pode parecer, em um primeiro momento, algo atrelado a ideologias que visam estimular o consumo em sociedades capitalistas. Não são poucos os que se sentem impelidos por uma espécie de “obrigação moral”, a comprar presentes nas várias Datas-De-Dar-Presentes do nosso calendário anual.

Presente de Páscoa, presente de Dia das Mães, presente de Dia dos Namorados, Presente para o Dia dos Pais, Presente de Dia da Criança, Presentes de Natal, Presentes de Aniversário, Presente de Amigo Secreto, Presente do Dia de cada uma das Profissões (Dia do Professor, Dia da Secretária…). Só para citar as que costumam ser mais lucrativas para o comércio, porém, se formos procurar datas (sociais) para presentear, certamente encontraremos muitas outras mais.

Entretanto, o ato de dar presentes vai muito além do simples movimentar a economia em certas datas padronizadas por uma sociedade. Antes de tudo, vale esclarecer, que não julgamos quem dá ou não presentes em certas datas. Não somos nem contra ou a favor aos discursos publicitários que induzem o consumo, ou aos discursos de cunho marxista que criticam o consumo em uma sociedade capitalista alienada. Acreditamos que não existe um único jeito certo ou errado, mas o ideal para cada pessoa em particular. Nesse texto, vamos pensar sobre o ato de dar presentes de acordo com a Filosofia Clínica.

O que é um Presente e qual seu significado?

Para começar, vamos nos perguntar o que é um presente? Será que um presente se restringe somente a algo comprado em alguma loja? Um artesanato, uma comida, um poema, feitos pela própria pessoa também não poderiam ser um presente para dar? Sendo assim, parece que um presente não precisa necessariamente ser algo comprado, ele pode ser algo feito pela pessoa que o dá. Mas perguntamos ainda, será que um presente precisa ser um objeto concreto? Um presente não poderia ser algo mais abstrato? Já ouvi pessoas falarem que o melhor presente que podem receber é o carinho, a gratidão, o reconhecimento, o amor, confiança, etc. Por acaso, já consideramos uma amizade como um grande presente? Então, podemos considerar que um Presente é algo muito relativo na hora de definirmos, o que é ou não um Presente.

Para cada pessoa haverá uma definição do que é um Presente. Mas se os presentes podem ser tanto coisas materiais palpáveis, quanto relações, falas ou sentimentos. Fica ainda mais difícil dar um presente a alguém.

O ato de presentear pode ter inúmeros sentidos ou significados. Há pessoas que não se interessam em presentear, há os que façam por obrigação, há os que gostam de dar presentes, há mesclas e derivações destes três tipos, há os que tratam esse assunto de acordo com as Interseções que têm com as pessoas, existe quem dê presentes até como um Dado de Semiose, por exemplo, quem expresse um sentimento como o amor em direção a outro por meio de presentes, há uma infinidade de maneiras de ser quando o assunto é presentear.

O mesmo também vale para quem recebe presentes. Para alguns receber um presente é motivo de alegria ou decepção, mexe com as emoções, para outros têm a ver com axiologia (o valor que a pessoa dá, ao presente ou a quem o deu), ou até ao Significado que a pessoa atribui ao presente ou ao significado associado a ele, um exemplo engraçado é o personagem Sheldon Cooper do seriado de TV “The Big Bang Theory”, que quando recebe um presente diz: “Você não me deu um presente, mas sim uma obrigação”. Para este personagem ganhar um presente se torna um motivo de grande estresse e preocupação pois ele se sente na obrigação retribuir o presente com outro de exatamente o mesmo preço.

Tenho um colega, filósofo clínico, que, certa vez, em uma conversa, me falou sobre a diferença entre preço e valor. Na hora de adquirir um presente, o Preço do mesmo pode ser superior ou inferior ao Valor que quem dá ou quem irá recebê-lo poderá atribuir-lhe.

Em um episódio[1], do mesmo seriado de TV, o personagem Sheldon Cooper, recebe como presente de uma amiga dele que é garçonete: um guardanapo autografado por alguém cujo qual ele era um grande fã. Na obrigação de retribuir a ela o presente que, para ele, teve um imenso valor, Sheldon compra muitos presentes de alto preço e ainda assim, achou que o valor não estava equivalente ao guardanapo que ela simplesmente pediu para o ídolo do Sheldon autografar quando o mesmo esteve no restaurante em que ela trabalhava. A garçonete, na personagem Penny do seriado, não pagou nenhum preço pelo guardanapo autografado pelo cliente do restaurante, mas o personagem Sheldon que o recebeu como um presente, atribuiu um inestimável valor a tal presente.

Com este exemplo buscamos desmistificar a ideia de que para presentear é preciso gastar dinheiro, ou esperar datas específicas para dar presentes. O presente ideal, pode surgir em alguma situação, como no episódio citado, pode ser algo gratuito para quem dá e de valor infinito para quem o recebe.

Tirando meia dúzia de receitas prontas, nunca encontrei na internet algo consistente que se ocupasse do tema Presentear. Assim sendo, lá vamos nós, filosofar um pouco sobre isso.

Tipos de presentes:

De modo geral, acredito que não seja possível classificar os presentes em categorias. Mas para fins didáticos, pensei em três categorias para estruturar este texto, nas quais vou enquadrar os Presentes. Porém, isso não contemplará tudo e poderá haver equivocidades, faremos apenas como um primeiro exercício para o pensar.

  1. Presentes baseados nos Exames Categoriais:

Para quem não está familiarizado com o vocabulário técnico da Filosofia Clínica, vamos traduzir os Exames Categoriais como sendo as informações mais básicas que podemos ter a respeito de uma pessoa. Por exemplo, onde e como vive, o que costuma fazer no dia a dia, se trabalha, estuda, por quais circunstâncias passa…. No caso de optarmos por dar um presente a alguém que não conhecemos direito ou sabemos tão pouco a respeito, podemos optar por montar informalmente os Exames Categoriais dessa pessoa, colher informações e com o pouco que conseguirmos, passaremos a escolher presentes dentro do contexto categorial dessa pessoa.

Vamos a exemplos de Circunstâncias: se a pessoa está se mudando de casa, pode ser um presente para compor a nova moradia; se está mudando de trabalho, pode ser um livro ou curso de capacitação para a nova função que a pessoa passará a exercer; se a pessoa adoeceu ou passou por alguma cirurgia, pode ser algo que a faça passar o tempo durante o período que ficará em recuperação. Caso saibamos um pouco sobre a categoria Relação da pessoa, por exemplo, se soubermos que ela tem uma afetuosa relação com um animal de estimação, um presente pode ser um acessório para o animalzinho dela. Ou se em alguma conversa ela trouxe algum Assunto que pode nos dar uma ideia sobre um presente relacionado a tal Assunto que ela nos falou, etc.

Os presentes baseados nos Exames Categoriais costumam encontrar aceite no mundo da pessoa que é presenteada. De modo geral, esses presentes não vão destoar tanto das Vizinhanças da pessoa. Por exemplo, você não daria de presente ingressos para um show de uma dupla sertaneja, para alguém que ama rock e não ouve nenhum outro tipo de música, daria?

Dar presentes com base no contexto da pessoa, é quase como se estivéssemos racionalizando e usando a lógica, as coisas parecerão meio óbvias. Outro exemplo óbvio: se você tem uma amiga que frequenta determinada igreja e, conhecendo-a dentro dos costumes religiosos que ela segue que é o de não usar maquiagens, obviamente, o Pré-juízo de que “toda mulher gosta de ganhar maquiagem de presente”, para essa amiga específica, não vale. Muito pelo contrário, talvez seria até um desrespeito a ela, por causa dos costumes que sabemos que ela segue.

É possível encontrarmos dentro dos Exames Categoriais da pessoa tanto presentes mais utilitaristas quanto presentes mais autogênicos.

  1. Presentes Utilitaristas:

Os presentes utilitaristas são os mais comuns da nossa época, são aqueles que buscam ter uma utilidade. Temos, uma característica social que costuma buscar a utilidade e a praticidade na maioria das vezes.

Sei que muitos achariam absurda a afirmação: “Dê um presente que seja inútil!” Como assim? – Pensariam que é quase que um dever dar um presente que seja útil à pessoa.

A própria mídia nos vende a ideia de utilidade, já parou para pensar quanta coisa que é inútil para nossas vidas, mas que compramos porque nos foram vendidas como se fossem imprescindíveis?

De modo muito superficial e sem certezas, pode-se dizer que para dar um presente que tenha utilidade, podemos nos valer de tópicos mais mecânicos da nossa Estrutura de Pensamento (E.P.), como o Tópico 1 (Como o Mundo Parece) que irá nos dizer o que é considerado de utilidade de acordo com a sociedade de modo geral, o que a família considera útil, a cultura… O Tópico 1 da E.P. na Filosofia Clínica, para quem não sabe, são as instituições, os coletivos (sociedade, família…).

Outro tópico, em Filosofia Clínica, que talvez alguns usem na hora de escolher um presente utilitarista é o Tópico 13 – Comportamento & Função. Por exemplo: ‘vou comprar isso, por causa daquilo’; ‘vou dar de presente para minha mãe uma máquina de lavar louças (Comportamento), para ajudá-la nas tarefas domésticas (função). Ou seja, o Comportamento é o presente que escolhemos dar, a Função a utilidade que julgamos que ele terá.

Alguns quando ficam em dúvida sobre o que escolher na hora de presentear, podem jogar tudo em uma “balança imaginária” e pesar os prós e contras de cada presente; e o escolhido será o que tiver mais prós na utilidade. Esse é um exemplo do Submodo 5 – Esquema Resolutivo em Filosofia Clínica.

Mas como podemos ver, as características da escolha de um presente, baseado no senso de utilidade do mesmo, costumam ser mais mecânicas, com forte peso no raciocínio.

  1. Presentes Autogênicos:

Por outro lado, os presentes autogênicos são aqueles que costumam usar Tópicos e Submodos menos mecânicos na hora da escolha. Por exemplo, podem se valer de uma Intuição na hora da escolha, ou de uma mistura de coisas em nós que não sabemos identificar, mas que podem nos dar certezas.

Diferentes dos presentes que têm uma utilidade ou daqueles meio “coringas”, sempre iguais, que servem para quase todo mundo, os presentes que escolhi chamar de Autogênicos são aqueles que se diferenciam na hora escolha. Costumam ser bem diferentes, seja para quem os dá ou para quem os recebe.

Aos colegas da Filosofia Clínica que possuem conhecimento sobre as Autogenias em Filosofia Clínica, encontrarão mais sentido e profundidade nestes escritos. Para quem desconhece o assunto, não se preocupe, é apenas um nome técnico que escolhi; poderia ter designado como Presente A, B ou C.

Os presentes autogênicos são aqueles que de alguma forma mexem conosco, têm algo de especial, embora nem sempre saibamos explicar o porquê disso.

Vou dar alguns exemplos, alguém que é uma pessoa bem sensorial e que ganhou de presente um perfume ou um difusor de ambientes e que ao sentir a fragrância muitas coisas boas acontecem dentro dela, lhe fazem bem autogenicamente, tem a ver com a pessoa como um todo e com a forma como tudo se organiza, se encaixa e se processa em seu íntimo.

Ou outra pessoa que costuma guardar emoções por imagens e que ganhou um porta-retratos no qual pôs uma foto de uma viagem linda que realizou, toda vez que essa pessoa olha para a imagem do porta-retratos fica tomada de boas emoções desencadeadas por essa viagem que outrora fez. Esse é um movimento que nem sempre aparece, as vezes acontece sem que a pessoa se dê conta.

Há muitos outros exemplos, nestes dois, falamos de coisas bonitas e que fazem bem à alma, mas, só para saber, o contrário também existe, há presentes que podem fazer mal à autogenia da pessoa, coisas nocivas à forma como a pessoa se estrutura internamente.

Considerações Finais:

Haveria muito para se falar aqui, mas parece ser prudente respeitar quando não conhecemos com mais profundidade caso a caso. Afim de evitar equivocidades de interpretação, é melhor ficar com o básico, no início.

Em Filosofia Clínica, na terapia, cada caso é estudado com esmero de acordo com suas especificidades, diferente dos exemplos aleatórios usados no texto. Cada pessoa, por ser única, é vista através de sua Historicidade e Estrutura de Pensamento (E.P.), também de forma única, não há como generalizar.

Talvez no âmbito da Filosofia Clínica, alguns colegas possam brincar dizendo que o Presente ideal só poderá ser escolhido depois de colher a Historicidade da pessoa, montar sua E.P. com direito a Exames Categoriais, Dados Divisórios e Enraizamentos. Mas e por acaso, isso é plausível? “Ôh, fulano, vem cá, me conta tua historicidade, vamos começar uma clínica filosófica, pois em breve você estará de aniversário e eu quero lhe dar um presente ideal.” Isso soa engraçado, não?!

É por isso que nos utilizamos informalmente da Filosofia Clínica neste texto, diferente do rigor com fundamentos e métodos exigidos pela clínica, trata-se apenas de uma forma diferente de pensar sobre as situações comuns do nosso dia a dia.

Isso é a Filosofia Clínica atrelada ao cotidiano, como no caso da “banalidade” de sair para comprar um presente para alguém. Quem foi que disse que a Filosofia Clínica só existe no consultório, focada em graves problemas existenciais? É inclusive isso, mas não somente. É também a leveza de tudo aquilo que não pesa em certos momentos do viver.

DICA DE FILME:

The Ultimate Gift (O Presente) – 2007, dirigido por Michael O. Sajbel, baseado no livro de Jim Stovall.

Trailer:

[1] 2ª Temporada – Episódio 11.

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